Martha San Juan França
17/11/11
Fazenda da Peugeot em área devastada serve de vitrine para proposta de regulação de carbono na atmosfera
Originário de projeto de reflorestamento, o crédito de carbono adiciona R$ 2,4 milhões a ação inédita da montadora no mundo.
Treze anos depois de iniciado o projeto que serviria de vitrine da preocupação da Peugeot com as emissões de carbono originadas da indústria automobilística, o reflorestamento de uma fazenda desmatada em Cotriguaçu, noroeste de Mato Grosso, obteve autorização para a comercialização de créditos de carbono no mercado voluntário.
A operação deverá assegurar recursos adicionais para o projeto superiores a € 1 milhão (R$ 2,4 milhões), além dos € 10 milhões (R$ 24 milhões) investidos pela montadora.
É o segundo projeto latino-americano de reflorestamento que consegue a aprovação dos créditos seguindo o protocolo Verified Carbon Standard (VCS), metodologia estabelecida por organizações não-governamentais, associações industriais, companhias de certificação, desenvolvedores de projetos e compradores de créditos para validar as reduções de gases do efeito estufa para comercialização.
O primeiro foi desenvolvido por duas empresas no norte da Colômbia, em uma área devastada pela prospecção ilegal de ouro e plantações de coca, além da criação de gado.
“É uma experiência em escala inédita no mundo pelo tamanho, validado pela comunidade científica brasileira e francesa, que vai ajudar muito no conhecimento sobre o sequestro e absorção de carbono pela floresta”, diz Marc Bocqué, coordenador do projeto na Peugeot.
Ele explica que o poço de carbono, nome pelo qual são conhecidos os projetos de compensação das emissões de carbono pelo plantio de florestas, está situado na fazenda São Nicolau, de 10 mil hectares (semelhante a área da cidade de Paris).
A proposta da Peugeot é compensar as emissões de 110 mil toneladas de CO2 por meio de reflorestamento de espécies nativas. O montante será integralmente reinvestido em ações ambientais, científicas e socioeconômicas do projeto até 2018.
A intenção da Peugeot, porém, é manter a fazenda por um período ainda maior (40 anos), para assegurar conhecimento ainda deficiente no mundo, sobre o volume de carbono que as florestas tropicais podem estocar em troncos, galhos, folhas e raízes, e assim ajudar a combater as mudanças climáticas do planeta. A experiência também serve como laboratório sobre a recuperação de áreas desmatadas na Amazônia.
Evolução do projeto
A obtenção dos créditos é uma boa notícia para um projeto que foi pioneiro em uma época em que a mensagem do reflorestamento ainda era pouco compreendida pelos países e empresas. Originalmente, Cotriguaçu foi concebido para ser implementado pela Agência Nacional de Florestas (ONF na sigla em francês), especializada no gerenciamento florestal da França, e o Instituto Pró-Natura, e se destinava a capturar cerca de 2 milhões de toneladas de carbono em 40 anos. A meta era ambiciosa: plantar 10 milhões de árvores em três anos em um ambiente cultural e ambientalmente estranho aos executores.
No início do processo, o baixo índice de sobrevivência das mudas plantadas em meio ao capim braquiária e a tentativa dos executores de querer resolver o problema adotando a pulverização aérea com herbicida, afetaram a credibilidade do projeto e obrigaram a uma mudança de abordagem. Foi preciso voltar atrás e buscar uma cooperação mais próxima com as instituições públicas e as comunidades locais, em meio a acusações de biopirataria nunca comprovadas.
“A aprovação dos créditos é o presságio de uma nova década para o projeto, para benefício de todas as partes envolvidas”, diz Bocqué.
O grupo diminuiu a área a ser reflorestada, ocupando o pasto aos poucos, e passou a contar com um comitê de assessoramento científico, constituído de pesquisadores de instituições políticas e acadêmicas do Brasil e da França.
Até agora foram reintroduzidas 2 milhões de árvores em 1,8 mil hectares, além de conservadas 7 mil hectares de floresta e 1,2 mil hectares de capoeira. A Peugeot também criou uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) no local.